Segmento projeta aumento de vendas para o exterior em 2025, mas teme elevação das importações e concorrência de asiáticos no mercado interno. Indústria de calçados de Franca começa ano com alta nas exportações
A guerra comercial entre Estados Unidos e China, iniciada com a volta de Donald Trump à Casa Branca, criou perspectivas para as indústrias brasileiras que exportam calçados, mas também trouxe dúvidas e desafios para o setor (veja mais abaixo) .
Em tradicionais polos produtores como Franca (SP), já chamada de capital do calçado masculino, a desvalorização da moeda brasileira e a ampliação de taxas para produtos asiáticos ajudaram a elevar em 14% as exportações do primeiro trimestre deste ano, com um faturamento local de US$ 64 milhões, e uma expectativa de ampliar a atuação no mercado norte-americano.
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Em contrapartida, o aumento das importações sinaliza para o risco de a própria China ganhar mais espaço no mercado interno.
"O que as estatísticas nos mostram e as vendas nos informam é que vamos ter um aumento com relação ao ano passado nas exportações. (...) A tendência agora é aumentar as exportações, ou seja, com essa situação do tarifaço, a tendência é que a China venha pra cá e vai abrir uma janela pra nós nos EUA e pode aumentar as exportações para aquele país", afirma José Carlos Brigagão do Couto, presidente do Sindicato da Indústria de Calçados de Franca (Sindifranca).
🔎Com a guerra tarifária, a taxação sobre o calçado brasileiro nos Estados Unidos subiu de 17,3% para 27,3%, segundo dados da inteligência de mercado da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados). Por outro lado, sapatos fabricados na China, Vietnã e Indonésia - que juntos concentram 71% do mercado de importação em território norte-americano - tiveram a mesma taxação de 17,3% elevada para valores cima dos 49%.
🔎Em outras palavras, mesmo sendo alvo de um aumento na taxação, o calçado brasileiro ficou mais competitivo na perspectiva da importação nos EUA, onde atualmente o Brasil tem uma participação abaixo de 1%.
Indústria de calçados de Franca, no interior de São Paulo.
Lindomar Cailton/EPTV
Oportunidade: explorar a parcela chinesa no mercado americano
Segundo os representantes do setor, a mudança nos padrões de taxação internacional tende a dificultar a entrada de calçados chineses nos EUA, ao mesmo tempo em que abre espaço para os produtos brasileiros captarem parte dessa demanda.
Nesse contexto, calçadistas estão otimistas com os primeiros resultados de 2025 e projetam uma melhora nos próximos meses. Segundo a Abicalçados, no primeiro bimestre do ano, as indústrias brasileiras exportaram 1,93 milhões de pares para os Estados Unidos, o que representa uma alta de 0,6% na comparação com o mesmo período do ano passado. O faturamento nesse período foi de US$ 37,17 milhões.
"Está tendo venda de 15% a 20% maior que ano passado. É um ano com grandes expectativas. O primeiro semestre tende a ser um pouco mais calmo, e a expectativa de aumentar até 30% agora no segundo semestre", afirma o empresário Rafael Luís Coelho.
Desafios: demanda além da capacidade e 'invasão' chinesa
Em contrapartida, os calçadistas acreditam que polos como o de Franca não têm condições de dar conta de toda a demanda de exportação aberta pelo encarecimento dos produtos chineses nos EUA.
Isso porque o setor esbarra em questões como a baixa disponibilidade de mão de obra e não se preparou, ao longo dos últimos anos, para se expandir a tal ponto.
"Não conseguimos abastecer em nível de indústria, de mão de obra, tem um problema na cadeia de suprimentos também, que não se deve conseguir manter esse fornecimento e todo atendimento que seria necessário", analisa a empresária Karina Ferracioli.
Em Franca , por exemplo, a capacidade produtiva já chegou a contar com mais de 30 mil pessoas em 2013, mas hoje não passa de 14 mil funcionários, segundo Brigagão.
"Vamos imaginar que um grupo de empresas resolve se unir pra poder atender um determinado volume de exportação. Primeiro que essas empresas têm que ter histórico, tem que ter tecnologia pra exportar e não é qualquer empresa que tem condições de exportar. Vamos imaginar que essas empresas tenham condições de exportar, mas vão encontrar uma situação difícil que é mão de obra pra suprir essa necessidade", analisa o presidente do Sindifranca.
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Além dessas questões estruturais, a reconfiguração tarifária acende um alerta para o mercado interno brasileiro, que pode ser ocupado por mais calçados chineses, mesmo com adoção de medidas protecionistas, como a taxa antidumping, que evita que um país exporte produtor abaixo do preço de mercado.
Triangulações com outros países da Ásia nas exportações, no entanto, podem driblar essas barreiras e prejudicar os fabricantes brasileiros. Segundo a Abicalçados, somente de China, Indonésia e Vietnã - que correspondem a 80% das importações do segmento - , o Brasil importou 6,6 milhões de pares entre janeiro e fevereiro deste ano, o que representou uma movimentação superior a US$ 80,6 milhões.
Mesmo com uma baixa da ordem de 3% nas importações da China, os outros dois países asiáticos ganharam espaço tanto em volume de produtos (alta de até 47%) quanto em recursos financeiros arrecadados (de até 37%).
"Temos o antidumping contra a China e isso tem segurado um pouco a entrada de calçados chineses no Brasil, mas o governo brasileiro nos negou o antidumpig contra Indonésia e Vietnã. (...) Toda a nossa produção do Brasil, 85%, é destinada ao mercado interno, o restante é exportado para vários países, entre eles os EUA. Se entrar uma grande quantidade de calçados chineses aqui, vamos perder parte desse mercado interno. As exportações que poderiam se abrir para nós nos EUA não vão compensar."
Empresas apostam em vendas online e no alto valor agregado de calçado brasileiro para garantir mercados interno e externo.
Lindomar Cailton/EPTV
Estratégias: contatos, vendas online e valor agregado
Com cenário favorável ou não, os calçadistas adotam estratégias, seja para consolidar as vendas no mercado interno, seja para expandir mercados no exterior. Karina Ferracioli descreve, por exemplo, a importância da participação em feiras internacionais de moda ou mesmo grandes eventos do setor realizados no Brasil, com a participação de importadores estrangeiros.
A demonstração da qualidade dos produtos e a abertura de novos contatos é um trabalho, segundo ela, que pode gerar resultados a médio e longo prazo com contratos na Europa, EUA e Oriente Médio.
"Viajamos nos últimos anos, 2023 e 2024, e fomos para a Europa. É um investimento. A fábrica sonhou com esse projeto e viemos nos preparando em termos de produto e tudo mais. (...) Fizemos muitos contatos, muitos amigos, muitos lojistas distribuidores, e foi um grande plantio que a gente está colhendo resultados até hoje desses contatos", diz.
A diversificação dos canais de venda também favorece os negócios. No caso da empresa de Rafael Luiz Coelho, o grande diferencial foi a aposta no comércio online, associado à agilidade nas entregas.
"Hoje a gente fabrica e entrega para o Brasil inteiro, muito prático e seguro. A gente tem alguns meios, tem canais, tanto no marketplace quanto em site próprio, que traz mais segurança para o cliente. (...) Também o que ajuda muito é a velocidade de entrega. Aqui a gente tem a disponibilidade de estar enviando hoje, em alguns meios de entrega o cliente pode receber amanhã ou dentro de uma semana para todo o Brasil. Isso é uma forma de fortalecer o nosso mercado e brigar diretamente com essas importações."
A aposta no alto valor agregado dos sapatos brasileiros também torna-se relevante nesse cenário de indefinições. "Eu valorizo o feito artesanal aqui, a gente valoriza a nossa fabricação, valoriza que é um produto brasileiro, um produto nacional."
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Momento também é uma oportunidade para produtores investirem na modernização das lavouras e manter crescimento nos próximos anos. Colheita começou oficialmente nesta semana no Espírito Santo, maior produtor nacional. Safra recorde e preço em alta animam produtores para início da colheita de café conilon
A colheita do café conilon começou oficialmente nesta semana levando otimismo às lavouras do Espírito Santo, o maior produtor nacional. A alta dos preços e a expectativa de uma safra recorde são motivo de animação para os produtores.
É o caso de Edson Costalonga Filho, produtor rural da região de Timbuí, em Fundão, na Região Metropolitana de Vitória. Nos últimos anos, por conta das temperaturas elevadas, ele registrou perda significativa na produção. Apesar disso, a expectativa é de que, nesta safra, esse cenário melhore.
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"Com certeza é um dos melhores anos, principalmente com relação ao preço. A gente também deu sorte de o clima ajudar muito. A diferença para este ano é que choveu bastante. O clima foi muito favorável desde o 'pegamento' de florada", afirmou.
Edson Costalonga Filho é produtor rural de café conilon em Fundão, no Espírito Santo
Reprodução/ TV Gazeta
Café conilon em alta
Em 2025, a cotação da saca do café conilon atingiu um recorde histórico, ultrapassando R$ 2 mil por quatro meses. Atualmente, a saca de 60 quilos é vendida a aproximadamente R$ 1.500, um valor ainda considerado atrativo.
Para o secretário de Agricultura do Espírito Santo, Enio Bergoli, essa arrecadação deve ser utilizada para modernizar a produção e aumentar os rendimentos nos próximos anos.
“Os produtores devem aproveitar este momento de preços razoáveis, de rentabilidade, para renovar as suas lavouras, em novas bases tecnológicas, mais produtivas, reformar os sistemas de irrigação, que sejam mais econômicos, utilizando menos água e energia”, explicou Bergoli.
Esses investimentos vão tornar o parque cafeeiro cada vez mais competitivo. "Está na hora de renovar as lavouras velhas, porque em algum momento os preços vão se acomodar um pouco e a gente tem que fazer o dever de casa, utilizando parte dessa rentabilidade para a renovação dos cultivos e na tecnificação das lavouras. Fazendo isso, lá na frente a gente vai suportar preços mais baixos e, ainda assim, ter mais rentabilidade na nossa cafeicultura", completou.
Grão do café conilon em fazenda do Espírito Santo
Reprodução/ TV Gazeta
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Oportunidade para o mercado capixaba
O Brasil é o segundo maior exportador de café conilon do mundo. Somente o Espírito Santo corresponde por 70% da exportação nacional.
Com a taxação global sobre produtos importados anunciada pelo governo dos Estados Unidos, o receio era o encarecimento e a redução do volume de exportações brasileiras. Na prática, o movimento foi contrário, porque outros países com forte produção de conilon foram taxados de forma severa.
Diante disso, o Brasil e o Espírito Santo ganharam mais espaço no mercado e os produtores aproveitaram o momento.
"Alguns desses exportadores trouxeram clientes de fora, que nunca compraram do Brasil, como Indonésia e Espanha. E eles estiveram aqui visitando a gente, visitando não só as nossas lavouras, mas várias ao longo do estado", finalizou Edson.
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